Calma que a gente já vai chegar no ponto onde o mercado corporativo se apropriou dessa palavra.
Por hora vamos analisar o papel que é atribuído a nós em nossa socialização.
A maioria de nós cresce acreditando que temos que seguir padrões para nos encaixarmos no que a sociedade espera.
Somos ensinados que meninos são assim e meninas são de outro jeito; que há apenas essa binaridade e ela é imutável; que devemos nos comportar de uma forma e que não podemos nos comportar de outra forma; devemos seguir algumas profissões, mas não seria legal seguir outras; que devemos amar de uma forma e que não há outra possível; que temos que ter uma família de uma forma e não considerar outras possibilidades; que devemos sempre responder que tá tudo bem e não compartilhar quando não está; que algumas coisas dão orgulho e outras são patéticas; que devemos rir de certas coisas e não problematizá-las; dentre tantos outros “ensinamentos”.
Somos ensinados a seguir padrões que perpetuam o sistema, a sociedade e as coisas como estão. De preferência sem questionar.
Por sermos repreendidos quando não seguimos esses padrões, internalizamos que divergências devem ser ignoradas e escondidas.
Porém, nem sempre é fácil fingir que não há nada “errado” e seguir tocando a vida.
Então passamos a performar.
Atuamos como se estivéssemos em uma peça com um diretor muito tirano, que não aceita improvisações e quer que cada vírgula do roteiro esteja presente em todos os ensaios.
Ao abrirmos mão de nossas críticas, questionamentos, curiosidades, conhecimentos e até de nós mesmos: abrimos mão do nosso respeito e convidamos os outros a fazerem
o mesmo.
É claro que a origem da palavra performance nesse sentido artístico é diferente da palavra performance no sentido de desempenho.
Contudo, a performance no ambiente corporativo também tem invadido o respeito.
Quando analisada friamente de forma numérica, quando exigem altos níveis o tempo todo, quando baseia a remuneração; isso incentiva a competição desleal, o ambiente de trabalho inóspito, o agravamento de condições emocionais, a abrir mão do tempo e energia da vida particular - em detrimento de um resultado que, mesmo quando compartilhado, não será redistribuído de forma proporcional ao esforço (mais valia) - além do risco de demissão.
Em ambas as definições, performar cansa, adoece, entristece, nos distancia da nossa essência e do nosso verdadeiro eu, reforça padrões, estimula a continuidade de sistemas exploratórios, além de nos deixar vulneráveis para seguirmos sendo desrespeitados.
Desleal, desumano.
Por isso precisamos lutar diariamente para que não precisemos mais performar em nenhuma esfera de nossas vidas.
É difícil e talvez utópico, é verdade; mas se não nos impusemos nada vai mudar, se não nos respeitarmos ninguém mais vai.
Questione as amarras que colocaram e que você mesmo colocou em si. Tente entender quais são os seus medos reais e pondere com os seus desejos reais. Forme e peça ajuda à sua rede de apoio nesse momento. Procure ajuda profissional para te direcionar.
Como cantou Cartola: “Deixe-me ir, preciso andar. Vou por aí a procurar rir pra não chorar. Se alguém por mim perguntar, diga que eu só vou voltar depois que me encontrar”.
Ontem eu participei de uma roda de conversa sobre desejos com a querida @mariwilliams, e saí com muitos pensamentos importantes para começar a refletir desde já - nada de esperar o ano novo pra definir minha nova personalidade por aqui.
Quem me conhece mais de perto (ou há mais tempo), já sabe que eu tenho um problema sério de não querer incomodar as pessoas.
E quando eu digo sério, não é só que eu sei qual porta do metrô vai abrir em cada estação e me posiciono pra não atrapalhar o fluxo de pessoas - apesar de fazer isso também.
Mas, por exemplo, eu deixo de curtir uma festa se começo a achar que alguma coisa que eu esteja fazendo pode incomodar outras pessoas. E essa coisa pode ser simplesmente: estar ocupando o espaço equivalente apenas ao meu corpo em um lugar que está muito cheio.
Ou então, assumo um papel super sério e quieto quando estou começando em um novo emprego - muitas vezes visto como arrogante ou difícil de lidar; sendo que naturalmente eu sou extrovertido, dou risada alto, interajo bem com pessoas de todas as áreas e tals, e isso - inclusive - torna o meu trabalho melhor, uma vez que estimula a minha criatividade.
Então, uma das decisões que eu tomei é que eu não performo mais! E esse é um convite para que você também se liberte.
Desejo que você encontre forças, apoio e condições para que possa performar cada vez menos.
Tamo junto 👊